Pratas da Casa: Wanderlei Massocatto
Acometido pela poliomielite aos seis meses de idade, Wanderlei Massocatto aprendeu, já na infância, a importância de ser forte diante das adversidades apresentadas pela vida. A paralisia nos membros inferiores não impediu que ele se transformasse no primeiro atleta deficiente do país a disputar dois Campeonatos Mundiais de Queda de Braço, ainda antes das competições paradesportivas serem efetivadas.
Durante essa trajetória, Wanderlei também construiu outras facetas da sua vida, dedicando ao serviço público os últimos 37 anos, ao longo dos quais cumpriu expediente no Hospital Mário Gatti e na Praça de Esportes Secretaria de Esportes e Lazer da Prefeitura de Campinas. Apaixonado pelo Guarani, também acompanhou de perto a fase áurea do clube, inclusive no exterior, em jogos da Libertadores da América.
Aos 60 anos de idade, completados no último dia 8 de julho, Vanderlei está convicto de que acertou nas decisões tomadas durante sua trajetória. Ao contrário de outros exemplos comuns na sociedade, as limitações impostas pela sua condição física não o desanimaram nem serviram de pretexto para a autopiedade ou o desânimo. Cada etapa foi encarada com resiliência e ele não tem na memória gesto algum de preconceito. A doença o impulsionou a ser expansivo, falante e com enorme poder de sociabilidade.
Apoio da família
O casal Clélio e Ondina Massocatto se desdobrou para proporcionar o melhor aos filhos Wanderlei e Valéria. Desde muito cedo, o respeito ao próximo foi um conceito ensinado, aprendido e aplicado sem restrição no seio familiar. E à medida em que se tornava adulto e ampliava seu círculo de relações, Wanderlei criou caminhos para ingressar no mercado ligado a área da saúde. Trabalhou no Hospital Irmãos Penteado e na Santa Casa de Misericórdia, sendo também diretor do Sindicato dos Enfermeiros.
Determinado a crescer profissionalmente, ingressou no Hospital Mário Gatti em 1986. Sua admissão foi formalizada após aprovação em testes realizados nas gestões do então presidente Aulus Sérvulus GoesTefiglio e do diretor administrativo José Destro.
Após dois anos e meio, vislumbrou a oportunidade de trabalhar como assistente administrativo na Praça de Esportes Edgar Ariani , localizada no bairro Chácara da Barra. E foi então que, aceitando o novo rumo que sua vida tomava, não só mudou de local de trabalho mas descobriu a importância da atividade física e da sociabilidade.
O esporte
A praça da Chácara da Barra foi um local marcante na vida de Wanderlei. Nesse mesmo espaço, aprendeu a nadar aos 12 anos, tendo como professores funcionários da própria praça, que abriram o caminho para a sua iniciação esportiva.
Nas piscinas, ganhou medalhas em torneios disputados entre as praças esportivas e clubes da cidade. Também na praça Edgar Ariani, jogou futebol de salão, hoje conhecido como futsal, junto com os garotos do bairro. Era goleiro, de vez quando arriscava jogar na linha e alguns adversários sofriam: “minhas muletas, às vezes, tinham como alvo algumas canelas”, relembra, sorrindo.
Mas ao conhecer Paulo Rogério Sabioni, o Periquito, na época professor de Educação Física e atleta de Luta de Braço, começou a fazer musculação. Disputou um torneio de supino, estilo de levantamento de peso voltado principalmente para o treinamento dos músculos peitorais, apresentando ótimo desempenho.
Constatado o grande potencial, dedicou-se à luta de braço, modalidade pela qual foi vice campeão paulista e vice brasileiro, enfrentando atletas não deficientes. Foram 24 anos competindo, inclusive nos Jogos Mundiais da Grécia(1989) e dos Estados unidos(1990).“Para representar o país lá fora, até rifa de liquidificador nós fizemos. Valeu muito a pena. Que aprendizado!”, recorda.
O ciclo na Luta de Braço terminou com uma grande comemoração. Na condição de paratleta, despediu-se do esporte de alto rendimento em 1993, ao disputar o Campeonato Mundial Paradesportivo, no Brasil. Ficou com a medalha de bronze, na categoria até 70 kg.
Duas paixões
O trabalho na Prefeitura, nos anos seguintes, ganhou ainda mais intensidade ao ser transferido para Sousas e promovido a administrador da Praça de Esportes Benedito de Santo. Montou no distirito a equipe de futsal do colégio Thomas Alves, que foi campeã dos jogos estudantis.
Outra etapa importante ocorreu no Balneário do Parque Portugal, onde comandou por cinco anos, “Uma equipe fantástica de trabalho. Da limpeza geral de toda a área, inclusive as piscinas, até o desenvolvimento administrativo da diretoria de esportes, tínhamos um grupo competente e comprometido, que cumpriu a verdadeira função de servir à comunidade, da melhor maneira possível”, nas palavras de Wanderlei.
Atualmente, é chefe de setor do almoxarifado da Secretaria de Esportes e Lazer, que distribui produtos químicos, material de limpeza, tintas para a pintura de campos e todo tipo de equipamento, incluindo os uniformes para os Jogos Abertos e Regionais, utilizados nas 33 unidades esportivas ligadas à secretaria. É dele a responsabilidade de receber todo o material e fazer a distribuição.
Perfeccionista, Wanderlei Massocatto é grato às oportunidades recebidas durante seu trajeto profissional: “ A Prefeitura é meu lar. Tudo que construí na vida é graças a ela. Por isso, sou extremamente agradecido e não admito críticas injustas”, ressaltou.
Wanderlei só fica cabisbaixo quando fala do Guarani, sua outra paixão, descoberta nos anos 70, junto com o primo Luciano. Lamenta o atual momento do time e se volta ao romantismo de décadas passadas, quando viu os jogadores bugrinos se tornarem campeõs brasileiros, em 1978. Nessa época, o time estava sob o comando de um dos grandes ídolos que teve no futebol: “O Zé Carlos era fora de série. Técnico, inteligente e líder. Ele e o Amaral foram os responsáveis por mostrarem à minha geração o que é futebol de qualidade”, não se cansa de dizer.
Mas paixão é paixão: apesar da fase difícil e das perspectivas imediatas pouco animadoras, Wanderlei, bugrino de carteirinha, sustenta firme o otimismo. E tem a esperança de um resgate dos bons tempos já vividos pelo clube.